BANCO SANTOS:VITÓRIAS EM DUAS FRENTES
As fundações que tinham aplicações com o Banco Santos estão atuando em duas frentes distintas para tentar recuperar os recursos. Um delas é a disputa junto à massa falida da instituição, cujas negociações passam por um comitê de credores, que teve seu representante substituído no final de novembro passado. O antigo representante Jorge Queiroz perdeu a eleição no comitê, dando lugar para Rodolfo Guilherme Peano, que recebeu cerca de 60% dos votos.
A Real Grandeza foi a principal articuladora, junto com o escritório Lobo & Ibeas, para a saída de Queiroz, que não estava agradando os fundos de pensão. Mesmo assim, as previsões são de que a disputa continue difícil uma vez que os recursos devem continuar gotejando de volta para o caixa dos credores.
Avanços em uma segunda frente têm demonstrado melhores perspectivas para a recuperação dos recursos. Dois fundos de pensão, a Fusesc (Codesc) e a Caixa da Usiminas, ganharam recentemente, em segunda instância ações na Justiça contra o Fundo Garantidor de Crédito (FGC). A novidade é que as ações garantem a recuperação integral dos recursos aplicados junto ao Banco Santos na época. A argumentação é simples: o limite de valor do ressarcimento é exigido para cada um dos participantes e não apenas para o fundo de pensão. “O argumento da ação é que a entidade atua como gestora dos recursos, mas os titulares são os participantes. Por isso, cada um tem direito ao valor de ressarcimento contra o fundo garantidor de crédito”, diz Vânio Boing, diretor superintendente da Fusesc.
A Fundação Codesc (Santa Catarina) tinha perdido a ação original contra o FGC em primeira instância, mas acabou recorrendo da decisão no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP). Por meio de um acórdão, assinado pela desembargadora Ligia Araúdo Bisogni, conseguiu reverter a decisão, porém ainda cabe recurso por parte do FGC.
Já a ação da Caixa da Usiminas contou com vitórias tanto na primeira quanto na segunda instâncias. O Tribunal de Justiça confirmou, no final de novembro passado, o ganho de causa do fundo de pensão contra o FGC. “Caso as decisões sejam mantidas, estaremos ajudando a criar uma jurisprudência para definir casos semelhantes, inclusive na questão do Banco Santos”, diz Sérgio Marcondes Akaoui, advogado do escritório Zamari e Marcondes, que defende os fundos de pensão.
Caso vencido – O advogado lembra que um caso semelhante, transitado e julgado, já abriu o caminho para a vitória das fundações. Foi a ação da Femco (Fundação Cosipa) que recuperou integralmente, inclusive com juros e correção monetária, os recursos aplicados no BMD, outro banco que tinha quebrado. Também neste caso, o FGC foi acionado e teve que cobrir os prejuízos da fundação, com base no número total de participantes na época. “Ao contrário do que diz o estatuto do Fundo Garantidor de Crédito, a entidade de previdência é apenas uma gestora de recursos, conforme definição da Lei 109. A referência para a devolução das aplicações não pode ser feita com base em apenas um CNPJ”, explica Akaoui. A legislação aprovada em 2001 indica que o titular das aplicações é o participante do plano de benefícios, sendo a entidade fechada uma mera gestora dos recursos poupados.
Pelo estatuto do FGC, a entidade teria direito a receber no máximo R$ 20 mil, que era o valor definido para aplicações em CDBs na época (hoje o valor é R$ 70 mil). Com a vitória na Justiça, aFemco teve direito ao limite para cada participante, o que garantiu a devolução integral das aplicações. O mesmo deve ocorrer com a Fusesc, que caso o ganho da ação seja confirmado, terá direito a reaver cerca de R$ 9,1 milhões. O valor corresponde às aplicações em CDBs que o fundo mantinha com o Banco Santos. No caso da Usiminas, os valores ainda não foram divulgados, mas também dará direito à recuperação integral dos investimentos perdidos com o Banco Santos.
Uma das dificuldades da briga na Justiça é o tempo. “É uma ação demorada, pois já dura cerca de sete anos, mas agora temos boas perspectivas de ganhar definitivamente”, acredita Vânio Boing, da Fusesc. A fundação também está brigando para reaver os recursos junto à massa falida do banco. Até agora recebeu apenas duas parcelas da massa. O dirigente explica que um dos problemas é que o número de credores é muito grande e que a representação dos interesses não ocorre de forma igualitária. “Há negociações em que nem tomamos participação e ficamos sabendo do resultado após a conclusão”, reclama o superintendente da Fusesc.
Insatisfação – Os fundos de pensão estavam descontentes com a atuação do representante do comitê de credores. O maior credor do Banco Santos é a Real Grandeza, que tem direito a cerca de 6% da massa falida – e até agora conseguiu recuperar apenas 15%. Outras entidades fechadas como o Postalis (Correios) e Sias (IBGE) também possuem grandes volumes para reaver. “Temos que pressionar mais o administrador da massa falida. As negociações eram concluídas com descontos muito altos, que eram desvantajosos para nós”, afirma Aristides Leite França, presidente da Real Grandeza.
Por isso, a fundação, junto com outros credores, lançou um novo candidato para substituir o representante do comitê, que era Jorge Queiroz. Ele havia sido indicado com o aval do próprio escritório Lobo & Ibeas, que representa os fundos de pensão, mas depois começaram os desentendimentos. O principal problema é que Queiroz estava negociando descontos considerados muito altos nos acordos para a recuperação dos recursos da massa falida.
Em conversas em um sub-comitê, formado por 104 dos maiores credores, dos quais 18 são entidades de previdência, foi articulado o lançamento de um novo representante. Em uma votação na última assembleia foi eleito o candidato defendido pela Real Grandeza e outras fundações, o economista Rodolfo Guilherme Peano, com ampla maioria dos votos. “Era o que estava faltando. Agora esperamos a realização de acordos mais favoráveis”, comenta França.
Diferentemente de outras fundações, a Real Grandeza não entrou na Justiça contra o Fundo Garantidor. “Fizemos uma avaliação anterior de que a probabilidade de ganhar na Justiça era muito reduzida e não valia o esforço”, lembra Eduardo Garcia, diretor de investimentos da Real Grandeza. Mas em virtude da perspectiva de ganho de ação de outras fundações como a Fusesc e a Caixa da Usiminas, eles não descartam a possibilidade de ingressar com uma ação no futuro. “Podemos reavaliar a estratégia caso outras fundações ganhem na Justiça contra o FGC”, indica Garcia.
A primeira parcela restituída pela massa falida veio apenas em agosto de 2010 – seis anos após a quebra da instituição em 2004. Cerca de 2 mil credores receberam, no total, cerca de 10%, do volume de recursos da época da quebra do banco – avaliado no segundo semestre do ano passado em R$ 3,4 bilhões.
Desde então, outras negociações foram realizadas, mas os credores viram apenas pouco mais de 5% voltar para suas contas. Para complicar o processo, recentemente a Receita Federal anunciou a cobrança de impostos devidos pelo Banco Santos em 2004, que totalizam cerca de R$ 140 milhões. O desconto deve reduzir ainda mais as expectativas de restituição das aplicações perdidas devido à quebra do banco de Edemar Cid Ferreira.
Papel do Fundo Garantidor em debate
A disputa na Justiça das entidades fechadas de previdência contra o Fundo Garantido de Crédito (FGC) amplia a discussão sobre seu papel. Depois da participação do FGC para resolver os problemas de liquidez do Banco Panamericano, especialistas e representantes das instituições financeiras passaram a debater sobre a mudança de função do organismo.
Criado para garantir os créditos dos investidores, o fundo passou a ajudar os bancos com dificuldades de liquidez e até atuar como ferramenta de auxílio para a reestruturação de instituições com risco de insolvência. Seu atual presidente, Gabriel Jorge Ferreira, que deve deixar o cargo no ano que vem, admitiu recentemente que mantinha comunicação direta com dirigentes do Banco Central que o procuravam para buscar saídas para instituições com problemas.
O questionamento do estatuto do FGC pelos fundos de pensão toca diretamente nesta questão. Enquanto o estatuto diz que cada entidade de previdência é considerada um único investidor, as fundações argumentam que são representantes de um grande número de participantes pessoas físicas. “O FGC foi criado com uma função social para dar segurança aos investidores em caso de quebras de instituições financeiras”, diz Sérgio Akaoui.
O advogado lembra que há vários casos de socorro a bancos com dificuldades e até de participação do FGC em negociações de aquisição de instituições, como ocorreu recentemente no BancoPanamericano. Porém, outro peso é dado na hora de garantir os recursos dos pequenos investidores. “A prioridade deveria ser a defesa dos investidores, principalmente dos pequenos, e não apenas ficar salvando as grandes instituições”, argumenta.
Fonte: Revista Investidor Institucional de janeiro